8 Anos depois, em casa …
Seriam 7h30m da manhã quando, já com o pequeno-almoço tomado e o carro carregado com as nossas “tralhas”, partimos para mais um fim-de-semana alargado de 4 dias, que um feriado tratou de abrir portas a uma “ponte”.
A minha vida é um autêntico frenesim. Não me recuso a nada e muito menos a um bom e salutar convívio. Apesar da missão parecer impossível, consegui facilmente prolongar o serão e estar sem dormir umas horas largas para preparar o evento – uma viagem por estrada sobre rodas, numa autocaravana.
A decisão tinha sido tomada acidentalmente em “cima da mesa”, enquanto decorria um excelente jantar, entre pratos e copos, saboreando o petisco, à conversa sobre as coisas boas da vida e o sentimento de liberdade que uma viagem transmite, como dizia o poeta Mário Quintana: “viajar é mudar a roupa da alma”. Ir é o melhor remédio.
Alguém agarrou a ideia, lançando de imediato a sugestão de um passeio, vamos fazer um passeio itinerante? Um outro, a favor da felicidade do lazer retorquiu com uma premissa: era obrigatório levar na bagagem muito boa disposição, alegria e, com um olhar brincalhão, ainda acrescentou e danados para a brincadeira. Todos se riram da marotice. Começaram logo a questionar: O que é preciso? Qual o destino? …
E o rumo aconteceu ali mesmo. Porque não o Gerês? Algumas outras sugestões se apresentaram para o roteiro, mas esta foi a grande ganhadora. O clima é temperado a quente, favorável para se visitar na primavera e aproveitar a paisagem, deixar-se seduzir pelas vistas deslumbrantes e perder-se na gastronomia local, com as deliciosas papas de sarrabulho, o cabrito assado, o cozido à portuguesa, os rojões à moda do Minho, a lampreia, a truta, o vinho verde, o mel…
Esta foi uma decisão que me agradou bastante. Apesar da pouca idade da Carminho e do meu sobrinho Samuel, que tornariam esta viagem, já de si cansativa ainda mais. Repentinamente surgiram recordações que me levaram a um tempo atrás até à mesma idade dos pequenos e, a minha memória, trouxe prà frente os belos passeios que, em pequena, fazia com o meu pai. Este era um dos passeios preferidos dele, como seria bom contar aos netos algumas das suas histórias vividas em família, dando-lhes ao mesmo tempo oportunidade de conhecer um avô, por eles nunca visto, já que falecera muito novo e na tenra idade da criançada (poucos meses).
Se preparar uma viagem destas, com tanto quilómetro pela frente, já era difícil, como seria fazê-lo na véspera do evento? Foi toda a noite num corre-corre, eu levitava, não havia tempo para sentir cansaço, sono, fome ou sede, só para fazer, fazer acontecer… Que noite tão intensa foi vivida nos preparativos, verificar todos os pormenores para garantir uma viagem sobre rodas sem percalços e em segurança, é essencial, para mais com duas crianças.
Divididas as tarefas, com a autocaravana não tinha de me preocupar, pois competia aos homens certificarem-se se a mesma estava nas devidas condições (manutenção, óleos, pneus, etc….) bem como o plano de viagem (mapas, guias turísticos, GPS actualizado). Seriam eles a definir a rota, qual o melhor percurso, distâncias, paragens, tempos de condução e de descanso, condutor e co-piloto. Não nos podemos esquecer que a fadiga e a distração são dois grandes “assassinos” na estrada.
Temendo os imprevistos inerentes a uma viagem sobre rodas e, como vale mais prevenir que remediar, tratei logo de incluir um kit de primeiros socorros, não fosse o indesejável acontecer, algumas garrafas de água, alimentos tipo snacks, bolachas e outros mantimentos também não foram esquecidos nem a bolsa de artigos de higiene.
A pensar nas crianças e para não ficarem irrequietas e impacientes, no banco lá atrás, nada melhor que levar e ter à mão algum tipo de entretenimento. Levo Tablet com jogos, desenhos animados e músicas, para os manter ocupados durante algum tempo e distraídos sem perguntas insistentes: “Já chegámos? Já chegámos, é agora? Falta muito? Ainda não chegámos? Estamos quase? …”. São opções que ajudam a passar o tempo e a esquecer a monotonia da estrada.
Distraidamente, enquanto estruturava esta empreitada, ia recordando os jogos que fazia nas viagens com o meu “Papi”. E revivi o das palavras encadeadas, giríssimo – tínhamos de encontrar uma palavra que começasse com a última letra da palavra anterior e assim sucessivamente, até um de nós perder e tudo recomeçava de novo. O jogo da Forca e os seus famosos tracinhos – tinha-se de encontrar a palavra escondida antes que o enforcado ficasse todo desenhado. Não gostava nada de perder a este jogo, ainda hoje não sei porquê, talvez porque ficava sempre na forca… Ah e aquele outro, o do Stop – com as letras do alfabeto diziam-se nomes, países, animais, frutos, cidades, etc., podíamos dizer ou escrever numa folha de papel.
Mas o melhor de todos era o das invenções. O Papi era um excelente contador de histórias e gostava muito de as inventar também. Era um regalo ouvi-lo. Lembro-me tão bem do jogo que fazia connosco. Começava uma história e os outros continuavam, à vez, a história dependia da imaginação de cada um. Todos delirávamos com o resultado da história e era sempre uma gargalhada geral no final.
Marcou-me tanto que inventei histórias para adormecer a minha filha, às vezes cantava-as com músicas conhecidas… riamo-nos muito. O pior era quando pedia uma determinada história que tinha contado há uns dias e eu não me lembrava. Com a birra do sono, a noite transformava-se numa desgraça, era um teste á minha paciência… “Não é essa… chorava” e repetia, repetia, até à exaustão… Comecei então a escrever os tópicos cada vez que inventava uma.
Recordar é viver. Tão Bom! Chamada à terra fechei os olhos para passar um bocadinho pelas brasas.
Antes de partir e antes do motor ligado e depois da “check list” vista e revista, estou confiante e feliz com a decisão, juntámos o útil ao agradável. O local escolhido para visitar o Parque Nacional Peneda Gerês com cascatas de rios cristalinos e miradouros, serras e colinas onde vivem veados, águias-reais, entre outros, para além de uma estância termal, o Santuário da Nossa Senhora da Peneda, entre outras coisas lindas e maravilhosas, traziam à minha memória belas recordações. Ficarão, sem dúvida, muitas histórias vividas a recordar e a transmitir aos descendentes.
“A vida não é o que a gente viveu, e sim o que se lembra e como se lembra para contá-lo.” Gabriel García Márquez
Gosto muito do seu cantinho e adoro o Gerês, as suas paisagens são incríveis.
Beijinhos,
Umas Palavras
Muito obrigada pelas suas simpáticas palavras. Abracinho hucilluc
Concordamos que as melhores memórias são dos dias que mentalmente fotografamos ao pormenor para que sejam sempre presentes.
Bom post 😉
Obrigada. Abracinho hucilluc