À conversa com Gilberto Gaspar, artista plástico

Artista plástico

À conversa com Gilberto Gaspar surpreendemo-nos com a sua vontade de criar, numa constante busca do novo, percorrendo um caminho feito de experiências, o artista diz-nos que a sua arte confunde-se com a sua vida.

 

“Não tenho limites e admiro a história da Arte assim como a do Mundo e o que têm para oferecer, desde a forma como é entendida no real e até a sua condição e conduta social.

São as cores que para mim refletem os estados do ser, são permeáveis à minha capacidade quase inata de compreender a luz nessa forma. É esse elemento que é a principal inquietação.”

 

Carrocel obra de Gilberto Gaspar
Obra: Carrocel. Série “Os Delírios do Artista”

 

Fale-nos um pouco de si, do seu percurso e de como surgiu o gosto e a vontade de se dedicar às artes plásticas?

Olá, eu sou o Gilberto Gaspar, nasci a 19 de Janeiro de 1964 na Mouraria em Lisboa. A vida mostrou-me no início o futuro que hoje vivo, o que é esta coisa de ser artista! As minhas primeiras manifestações já fazem parte da nostalgia, quase que tudo começou nos anos 70 (para não dizer, que nasci a pintar, com agora que se nasce já a gritar para o telemóvel). A vontade para ingressar na António Arroio, a famosa “Amo te”, foi o passo para o meu percurso académico na direção das Artes. Este caminho foi mostrando a necessidade de continuar a experiência, a conquista da faculdade de Belas Artes de Lisboa, na minha cidade berço. Não foi fácil. Ainda passei pelo Curso de Desenho, Sociedade Nacional de Belas Artes, frequência do curso de Artes Plásticas da Escola Superior de Arte e Design das Caldas da Rainha. Por volta dos meus 5 anos comecei a frequentar outro lugar, a Lagoa de Albufeira, onde vivo hoje

O meu percurso de Artista começou na década de 90 e considero que tem sido um acumular de experiência até aos dias de hoje. Lembro-me do meu primeiro atelier no meu próprio quarto (partilhado com o meu irmão mais novo).

Recentemente fui convidado pela Águas do Tejo Atlântico empresa de Saneamento, a fazer 12 desenhos de lugares e monumentos em Lisboa, que foram transformados em “Tampas de visita” uma intervenção urbana que deu pelo nome “Há Art no Esgoto”.

Sempre fiz exercícios ambiciosos, uma procura constante para me superar. Hoje considero que é mesmo possível essa superação e pratico-a com a mesma garra de outrora.

 

Obra de Gilberto Gaspar
Obra: Business Man

Os tempos já são outros, tenho 58 anos de uma vida que escolhi, com tudo, desde o esforço sempre presente assim como a persistência no ânimo criativo do futuro, ao longo deste percurso tortuoso, o que fica é experiência e ou conhecimento para construir o surpreendente. Aquele que é o Novo, o nunca visto, apesar de palavras feitas se dizer que a originalidade já não existe! Este caminho fez-me conhecer várias técnicas, desde a gravura, serigrafia, cerâmica, escultura, pintura a óleo, pintura a acrílico, desenho e aguarela.

Considero-me um Artista Visual que escolheu a pintura como o meio de expressão principal.

 

As cores, as figuras representadas, as simbologias e o movimento que vemos nas suas obras transmitem alguma inquietação. Essa inquietação vive em si e é própria do artista?

Movimento é a palavra mais cara do meu percurso. Não tenho limites e admiro a história da Arte assim como a do Mundo tem para oferecer, desde a forma como é entendida no real e até a sua condição e conduta social. São as cores que para mim refletem os estados do ser, são permeáveis à minha capacidade quase inata de compreender a luz nessa forma. É esse elemento que é a principal inquietação.

 

As suas experiências de vida são fonte de inspiração?

Sem dúvida, As viagens, os lugares por onde passei e vivi no início foi a descoberta das possibilidades com o confronto com os materiais, seguindo o academismo preso aos seus conceitos. Agora a maior parte dos segredos estão desvendados, reflectindo-se hoje de uma forma mais concreta e livre, o gesto plástico físico de representar é solto e mais assertivo.

Obra de Gilberto Gaspar
Obra:  O Caldeirão. Série “Os Delírios do Artista”

 

Como se desenvolve o seu processo criativo primeiro pensa a obra e depois escolhe a técnica, materiais, etc., que mais se adequa à sua visão do que pretende representar?

Geralmente o processo passa por uma espécie de “brainstorm” somado a recolhas de informação, imagens, a realizar gera o conteúdo da ideia. O primeiro estado criativo acaba por compartimentar a ideia numa série com um título. Geralmente é o nome da exposição. O momento de escolhas dos materiais, primam pelo domínio no seu confronto procurando assim resultados, muitas vezes frágeis, são essas fragilidades que com o desenrolar do trabalho se transformam em músculos do seu próprio corpo de pintura.

 

Ao criar sente harmonia ou inquietação?

As duas, harmonia e inquietação, gosto do confronto desses dois estados criativos, a frescura do início e a complexidade do suposto fim. A minha obra pauta-se por estar sempre incompleta/inacabada.

 

O sucesso das suas obras é pautado com trabalho duro e exaustivo ou segue o ritmo do que pensa?

A premissa de criar condições gera trabalho duro e exaustivo, que tem a sua cota parte na satisfação conjugada  com o ritmo de tornar concreto a ideia.

 

Na sua opinião a arte deve ter um papel interventivo na sociedade?

A arte deve falar por si, deve ser permeável para criar e intervir na sociedade, o “mundo dos humanos”!

Obra de Gilberto Gaspar
Obra: Oásis. Série “Trilhos”

Que técnicas e correntes de arte com as quais mais se identifica? Tem algum artista que particularmente admira?

Sou eclético no que diz respeito à arte, não tenho ideias fixas, mas partilho admiração por autores que se manifestaram na história de formas para mim intrigantes, como William Blake, Hieronymus Bosch, Francis Bacon, Picasso, Andy Warhol, Cruzeiro Seixas e muitos outros.

 

Já realizou várias exposições individuais e coletivas. Qual foi a mais importante ou a que constituiu um marco impulsionador na sua carreira como artista?

Para mim foi “Mapas de Pele” em Lisboa, Novembro de 2009. Um marco de ruptura com o academismo, não acredito na fórmula “chapa Amarela”, defendo a superação do ser, aquilo que se vê neste momento pode não ser a verdade de agora, assim as séries por mim criadas a seguir como: “Arquiteto do efémero”, “Farol. Invaders must die!”; “Os TVnautas” e, mais recente, “Os delírios do Artista”. Uma fase mais intimista feita de memórias do senso comum em pretexto inusitado.

Obra de Gilberto Gaspar
Aguarela “Manjar de Blu”

No seu ponto de vista, para além do talento inato, o que considera ser fundamental para que um artista e a sua obra sejam reconhecidos?

Sem margens para dúvidas, a persistência. Uma luta incansável quase infernal no vazio para o cheio, o corpo da Arte. Esta vida por vezes não parece uma dádiva mas sim uma “maldição” pela necessidade de produzir todos dias, não procuro o reconhecimento embora sinta que a Obra o merece. Sou a favor da instabilidade que provoca a mudança.

 

Inspire-se nas obras, na experiência de vida e palavras do artista Gilberto Gaspar que diz: “defendo a superação do ser”.

A equipa de Hucilluc- Aqui e Ali, liga-nos ao que nos rodeia-, agradece a Gilberto Gaspar por esta conversa.

 

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