À conversa com Catherine Morisseau, pianista e não só!

Catherine Morisseau seguiu o sonho de se dedicar à sua arte como pianista e vive em Lisboa há cerca de vinte anos.

Assim é Catherine Morisseau, a mulher e a pianista

Catherine abriu-nos a porta de sua casa, recebeu-nos com um sorriso franco e falou-nos de si, do seu amor pela música, pelo piano, por Lisboa.

O meu amigo, o meu mundo, o meu tudo, o meu piano”

 

A sua casa, um terceiro andar de um prédio antigo na zona de Alfama, decorada de forma minimalista e com alguns objetos e materiais reciclados, tem uma sala com duas amplas janelas por onde entra o sol e se vê o rio Tejo. Nesta sala, um belo piano ocupa um lugar de destaque. Foi aqui na sua casa, a que Catherine chama de atelier de experimentação, que nos sentámos a conversar e a beber chá.

 

“Não existe fronteira entre mim, a minha casa, a minha vida e a minha arte.
Este espaço é não só o meu lugar de criação, mas também o mundo onde me encontro a mim própria e que reflete a minha personalidade e alma.
A minha casa é uma prolongação de mim própria”.

 

Catherine não só se dedica ao piano como à fotografia. Em sua casa pudemos apreciar algumas das suas fotos expostas nas paredes. São fotos que ela própria tirou com a sua antiquada máquina Lubitel, de maneira muito “artisanal“, à semelhança de todo o seu processo criativo. Preocupa-se em crescer aperfeiçoando o conhecimento e a experimentação não só na música, mas também nas artes gráficas, fotografia, cinema, poesia, literatura…, transmitindo uma imagem coesa daquilo que sente ser como artista.

 

Catherine chega a Portugal

Afirma que na sua adolescência desconhecia de todo este país à beira mar plantado. Nasceu e viveu a juventude na cidade de Paris, mas apaixonou-se por Portugal quando, aos 18 anos, quis o acaso que fizesse uma temporada de voluntariado em Aguiar da Beira, na Beira Alta. Foi uma forma de encontrar pessoas e por outro lado: “conhecer um país por dentro e não com uma abordagem turista que seria mais superficial“.

Conta Catherine que toda a viagem foi uma grande aventura, demorando 35 horas a chegar ao destino, depois de vários desvios. Mas foi uma viagem inesquecível, algo de iniciático. Foi uma revelação conhecer os portugueses, as “gentes” da terra.

 “Na verdade, são as pessoas que fazem um país, não o sol, a comida ou os monumentos”.

Terminando o voluntariado e com o pouco dinheiro, as duas jovens conhecendo outros jovens portugueses, acabaram por ir parar a Lisboa e se apaixonar pela cidade. Nesta altura, Lisboa era uma cidade genuína, de bairros característicos, com populações misturadas e um espírito de aldeia, de comunidade. Os artistas tinham espaços e liberdade para se expressar, o rio e a luz da cidade formavam um ambiente citadino mas encantador e propício ao desenvolvimento dos seus interesses culturais.

Regressando a Paris, terminou a faculdade: uma licenciatura de História da Arte e um mestrado de Conceção e Realização de Projetos Culturais, ambos na Sorbonne, piano na Ecole Normale de Musique de Paris, aprendendo também fotografia graças aos seus amigos estudantes em fotografia na Escola Louis Lumière.

Os 10 dias de Catherine em Lisboa que mudaram o curso da sua vida.

A natural vontade de se afirmar como jovem adulta independente, seguindo a sua paixão pelo piano e com o fascínio por Lisboa a chamá-la resolveu partir na aventura de regresso a Portugal, convencida que era o lugar onde podia concretizar os seus sonhos.

Em segredo comprou um bilhete de ida e volta por 10 dias, comprometendo-se a encontrar uma solução para se fixar neste país que tanto amava e a não usar o bilhete da volta. Em quatro dias, tinha encontrado um emprego como pianista. E nunca se arrependeu.

“Foi a melhor escolha que fiz na minha vida”

O que parecia ser difícil tornou-se, por incrível que pareça, viável!

Catherine fixou-se em Portugal

Começou por tocar em hotéis de luxo (nesta altura era obrigatório um hotel de luxo ter pianista), emprego ideal para quem, como ela, ainda não dominava a língua e tinha medo de tocar em público. Também criou um duo com um cantor e ator francês a residir como ela em Portugal, além de outras experiências a acompanhar cantores e músicos.

Passado uns meses começou a trabalhar no Hotel Tivoli Palácio de Seteais, em Sintra, um espaço mítico, onde permaneceu durante 4 anos. Uma experiência que considerou ser muito interessante e enriquecedora.

No entanto, terminado este ciclo (como pianista de hotel) deu início a novas experiências. Inscreve-se na Escola do Hot Clube de Portugal e, com uns amigos, fundou uma banda de música francesa dos anos 50 e 60, os Moi Non Plus… Mas ainda não se sentia completamente realizada como pianista: para isso teria de compor música!..

O caminho de Catherine como compositora de música

E mais uma vez uma oportunidade chegou! Foi convidada a acompanhar ao piano um festival de filmes Super 8, realizados por amadores, que não tinham som. Era a primeira vez que inventava músicas, além de as improvisar ao vivo nos filmes.

“Gostei tanto da experiência que decidi que era exatamente isto que queria fazer”

Mas a experiência não terminaria por aqui. Num concerto que realizou em Braço de Prata, encontrava-se na audiência uma das responsáveis da Cinemateca, que gostou e a convidou para acompanhar ao piano filmes mudos na Cinemateca Júnior.

Prontamente aceitou e até hoje continua a produzir música não só para a Cinemateca Júnior, mas também a convite de festivais e salas, para pequenas e longas-metragens.

 

“Ao escrever música sinto-me realizada enquanto artista. É o que me faz vibrar, viver, respirar,… Quero continuar esta busca, gostaria de continuar a desenvolver esta vertente de compositora. É definitivamente o meu caminho”

 

Um olhar/ouvido inovador

Outras paixões é a imagem, o ter estudado História da Arte ajudou a desenvolvê-la. Adora fazer fotografia.

 “Diria que as minhas fotos têm algo de musical, e a minha música tem algo de visual, e que ambos têm muito de cinematográfico”

O processo criativo, para Catherine, concretiza-se com o produzir algo poético, imperfeições voluntárias e assumidas, um certo “ruído” textura visual e musical que também faz parte do seu conceito e que traz um olhar/ouvido inovador, renovador…

O album Myriades

Na mesma altura que começou a criar músicas para acompanhar os filmes, também criou músicas com as quais inventou o conceito de “Concerto Deitado”: Convidava o público a ouvir a música deitado, projetando imagens no teto da sala, colaborando para este fim com uns video-artistas.

Conheceu o Bernardo Sassetti que gostou do seu trabalho e a encorajou a gravar. Ter um produtor desta qualidade não se podia desperdiçar e convenceu-se de que valia a pena guardar um registo das suas músicas. Sassetti faleceu entretanto, mas o “bichinho” da produção de um CD ficou. Este triste acontecimento fê-la lembrar da importância para um músico e, em particular compositor, de permitir às gerações futuras conhecer a sua obra.

Surgiu então uma segunda oportunidade de gravar: a Diana Cangueiro, também pianista e que tinha estudado as técnicas de produção e gravação, prontificou-se para a ajudar, processo que durou um ano.

“Myriades”, que vem do grego myrias, myriados (dez mil) e significa em francês uma grande quantidade indeterminada, designa poeticamente por exemplo as inumeráveis estrelas a cintilar, brilhar.

Este CD, no qual é autora de todas as músicas, letras, poesias e arranjos, além de intérprete ao piano, conjuga uma linha neo-clássica minimal com um índice intimista, de sonoridades melancólicas e envolventes. Foi realizado e gravado de maneira “artisanal“, com calma e ponderação, é uma edição de autor e está à venda no: “Bandcamp”.

Sem pressas, convidou os músicos que queria e como queria. Desta forma, contou com a participação de nomes de particular relevo do horizonte musical português, tal como o contrabaixista Carlos Barreto, elementos do Coro Gulbenkian, e muito mais excelentes músicos, que tornaram este disco único.

 

Catherine uma mulher determinada

Nesta conversa com Catherine ficámos a conhecer uma mulher suave, simpática, mas determinada, de convicções fortes e preocupada em desempenhar um papel  ativo na sociedade. É com esta convicção que nos fala da sua preocupação com o ambiente e com a natureza, mas principalmente da necessidade imperiosa da preservação de todo o património cultural da cidade de Lisboa.

Fotos

Outros sonhos

Catherine diz ter ainda, muitos mais interesses e sonhos para concretizar, mas as horas passaram rápidas nesta primeira conversa. Fica a promessa de, em outra oportunidade, voltarmos à conversa com Catherine.

Recomendamos

Recomendamos, porque verdadeiramente apreciamos muito, que compre o seu álbum, que pode ouvir e comprar em:

https://catherinemorisseau.bandcamp.com/

facebook: https://www.facebook.com/Catherine-Morisseau-128609743911454/

instagram: https://www.instagram.com/catherinemorisseau/

 

Testemunho de Sofia Rebelo de Sousa

(texto escrito “a quatro mãos” com a sua amiga Sofia Rebelo de Sousa, que retrata a postura e o trabalho de Catherine)

 

O NATURAL BELO VIVER

 Viver poeticamente, viver junto da árvore que tudo contém: o céu, a terra, as estrelas, a memória do universo, a presença do mundo, a seiva – pulsação invisível e inaudível da humanidade inteira.

Permanecer assim, musa adormecida no espaço infinito, perdida em eternos sonhos: sonhos de eternidade…

 Contemplar a imobilidade, ampliar o silêncio: uma proposta para outro Ser, ligado à essência.

 Ou coração navegante em rio de ouro e pétalas, colher dádiva, pureza, simplicidade, pujança!

 Ou caminhar in existência, sentindo tudo de todas as maneiras, e que a terra nos seja leve.

 Dar a ver e viver a vida sonhada, tão vasta quanto os horizontes. Partilhar a paz, a coragem, a vibração luminosa do universo: esta una, única, indizente, incalável flor irradiante de sabedoria, voz e verdade do Ser no mundo.

 E assim, se a Beleza salvar o mundo, salvemos então a Beleza!

 

 

 

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